quinta-feira, 23 de novembro de 2023

ESG e o blábláblá do mercado de carbono


Publiquei 17 anos atrás o livro, resultado de dissertação de mestrado em Geografia na UFSC, intitulado “Quando a palavra sustenta a farsa: o discurso jornalístico do desenvolvimento sustentável” (Editora da UFSC). Quase duas décadas se passaram e a farsa continua e se aprofunda. Os Grupos NSC e ND dão amplo espaço ao evento “ESG Summit Brazil”, realizado nos dias 21 e 22 em Florianópolis com o tema “O Futuro é Verde”. ESG, do inglês “environmental, social and governance”, é a sigla da moda e tem a ver com práticas ambientais, sociais e de governança de uma organização. O termo vem de uma publicação do Pacto Global em parceria com o Banco Mundial e está relacionado aos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), outra cortina de fumaça da ONU e entidades internacionais para distração enquanto o modo capitalista de produção acumula catástrofes. Ainda que seja irrelevante pela obviedade da conclusão, analisar o discurso jornalístico desses grupos de mídia catarinense traz de carona (sempre) a voz do empresariado e, com ela, a possibilidade de desvendar a ideologia do ESG.

O ND afirma que o evento “ganha relevância ao abordar temas cruciais para o desenvolvimento sustentável” e inclui debates sobre “Para onde caminha o mundo, caminham os negócios”, “ESG como pauta protagonista na gestão de marcas”, “Descarbonização e a importância de parcerias público-privadas na construção da nova economia verde”, entre outros temas “impactantes”.

No dia 21, notícia no site do ND tinha o seguinte título: “Com 5 tornados em menos de 1 mês, CEO da ONU Brasil diz que cenário pode piorar em SC”. Os entrevistados foram o “CEO” do Pacto Global da ONU no Brasil e o “VP” do Conselho de Administração da VALE, a gigante da mineração privatizada em 1997 que acumula crimes contra a natureza, como em Brumadinho e Mariana. Com esse histórico, os executivos, dando pitaco sobre os tornados em Santa Catarina, foram ao evento apresentar “soluções para um futuro mais verde e a criação de empresas mais sustentáveis”. Nessa linha, o ex-presidente da Louis Vuitton Brasil, marca de bolsas e malas, falou sobre o tema “ESG como pauta protagonista na gestão de marcas”. Ou seja, o blábláblá da sigla é só isso, negócio.

Como tem muito defensor da natureza seduzido pela ideia do chamado “mercado de crédito de carbono”, mais uma artimanha do Banco Mundial gerenciada pelas empresas, vale citar a presença, no evento, de uma empresa especializada em comprar “tokens” de crédito de carbono para uma pessoa ou empresa compensar sua emissão de gases de efeito estufa. “No site da empresa é possível calcular, na hora, quanto de carbono você emite e, depois, fazer esta compra de crédito”, informa a matéria.

É tudo para apaziguar a consciência e plantar a certeza de que as empresas darão solução ao horror ambiental que elas provocam. E isso na quinzena em que o Norte do país respira fumaça, o meio ferve no calor recorde e o Sul submerge em chuva sem trégua. 

quarta-feira, 22 de novembro de 2023

Primórdios do Jornalismo Ambiental em Santa Catarina - Entrevista com Moacir Loth


Em 16 dezembro, a Revista Pobres & Nojentas e a Letra Editorial lançam uma edição limitada impressa do livro “Território e texto: jornalismo ambiental em Santa Catarina”. Nas pesquisas, descobrimos que o jornalista Moacir Loth, em 1978, no Jornal de Santa Catarina, de Blumenau, em parceria com a Associação Catarinense de Preservação da Natureza (Acaprena), inaugurou uma Editoria de Meio Ambiente que durou até 1979. Deve ter sido, salvo melhor juízo, a primeira iniciativa em Santa Catarina a dar a essa cobertura uma editoria específica. Para registrar o fato, convidamos o Moacir para uma entrevista na qual ele detalha aquela iniciativa pioneira. Confira!



Livro "Território e texto: jornalismo ambiental em Santa Catarina" em pré-venda


Está a caminho da gráfica o livro “Território e texto: jornalismo ambiental em Santa Catarina”, com seis artigos de jornalistas que, em momentos de sua trajetória, abordaram a relação entre sociedade e natureza no estado. Mais uma produção da
Revista Pobres & Nojentas com a Letra Editorial!

A ideia era fazer um livro virtual, mas decidimos imprimir uma edição limitada a ser lançada em dezembro. Quem deseja garantir um exemplar em pré-venda pode fazer o pedido "in box".

São R$ 30,00 e a entrega pode ser no dia do lançamento ou pelo Correio (com acréscimo de R$ 7,00). 

O livro traz valiosos achados, ficou bonito e sinaliza caminhos para pesquisas e fazer profissional. Santa Catarina merece um jornalismo comprometido com sua realidade socioespacial tão diversa e cada vez mais afetada pelas mudanças climáticas.

Textos de:

-Edson Rosa

-Elaine Tavares

-Imara Stallbaum

-Míriam Santini de Abreu

-Moacir Loth

-Rosane Lima

Foto de capa de Tasso Claudio Scherer e capa de Sandra Werle

Como a Hercílio Luz não tem


Acabo de concluir a escrita de um de dois artigos resultantes da análise de 10 anos da cobertura jornalística do ND sobre a Avenida Hercílio Luz, quase 500 achados, e de oito saídas de campo realizadas ao longo de 9 meses. Nesse tempo, pude testemunhar as transformações cotidianas que vão dando nova cara para a rua: o fechamento e a abertura de comércios, os novos usos, como os patinetes, os novos usuários e usadores e as antigas sociabilidades, como os jogadores de dominó que todos os dias batem ponto na frente do “Paredão”. Flagrei o desaparecimento de um dos últimos orelhões do centro, também na frente do “Paredão”, fato para o qual minha atenção foi chamada graças a uma reportagem feita pelo jornalista Billy Culleton para o Floripa Centro e depois reproduzida no ND. Numa das saídas, vi que a galeria ao Sul, perto da Gustavo Richards, estava aberta, e fiquei um tempão observando e fotografando o Rio da Bulha. 

Cheguei a cinco boas conclusões.

Passo na Hercílio e pergunto aleatoriamente:

– Você sabe que aqui embaixo corre um rio?

Quase ninguém sabe.

Hoje mesmo fui até o Rio’s Bar, ali na frente do Clube 12, tirar uma dúvida, e descobri que em dezembro próximo ele completa 56 anos. 

Dizem que a Trompowsky é avenida mais charmosa da IIha. Ela tem árvores bonitas, prédios chiques e é pobre de sociabilidade. 

Como a Hercílio Luz não tem.

quarta-feira, 15 de novembro de 2023

Debate nesta sexta (17) marca uma década das Ocupações Contestado e Amarildo de Souza


Nesta sexta-feira (17), às 19 horas, na UDESC, haverá debate para refletir sobre duas experiências que marcaram a luta urbana da Grande Florianópolis a partir de falas de seus moradores, apoiadores, pesquisadores e militantes.

Em novembro e dezembro, as Ocupações Urbanas Contestado, em São José, e Amarildo de Souza, no Norte da Ilha, completam 11 e 10 anos, respectivamente. Essas ocupações são experiências que iniciam o segundo ciclo de ocupações organizadas na Grande Florianópolis, conforme as pesquisas do professor Francisco Canella, da UDESC, e com elas os movimentos sociais locais se rearticularam pela luta por moradia. 

A Ocupação Contestado foi capa do número 29 da revista Pobres & Nojentas, lançado em dezembro de 2012. A reportagem de 5 páginas, assinada pela jornalista Marcela Cornelli e intitulada “Luta por terra e dignidade”, narra os fatos que levaram as famílias a ocupar e entrevista moradores e lideranças dos movimentos sociais. A revista pode ser lida neste link: http://hemeroteca.ciasc.sc.gov.br/revistas/POBRES%20E%20NOJENTAS/PEN201229.pdf

A revista Pobres & Nojentas também cobriu a Ocupação Amarildo de Souza, que sofreu violenta repressão policial, judicial e midiática. Os dois vídeos são os seguintes:

Ocupação Amarildo - Trabalho, terra e teto - https://www.youtube.com/watch?v=ZEPiPRD8Ml4

Quando morar é um direito - https://www.youtube.com/watch?v=FR_-82JSinY&t=1s

Vai ser um bonito momento para relembrar essas duas grandes lutas por moradia e avaliar o caminho a ser percorrido de forma coletiva.

O evento é uma iniciativa do LABGEF da FAED/UDESC, Instituto Caeté e OcupaSC, em parceria com as ocupações e organizações políticas que atuam junto delas.


terça-feira, 14 de novembro de 2023

Três máquinas e uma faculdade


Flagro a cena e ela é boa para homenagear as três máquinas que me ajudaram a pagar a faculdade de Jornalismo: a de costura, a de overlock e a mãe. Na época, não havia Jornalismo na Universidade de Caxias do Sul, e assim iniciei o curso em 1990 na Unisinos, em São Leopoldo. Trabalhava como estagiária e depois contratada na extinta Folha de Hoje e, às 17h45, eu tinha que correr até a frente da Catedral, de onde saía diariamente o ônibus que levava os estudantes da Unisinos para as aulas. Voltávamos a Caxias perto da meia-noite e meia e eu, sozinha ou com o amigo Samuel, corria as quatro quadras até minha casa. No inverno era pior, e pior ainda quando havia neblina. 

Passados dois anos e meio, aquela rotina começou a me cansar e decidi morar em São Leopoldo. O pai não queria e, em meio às discussões, a mãe foi enfática: 

– João Flávio, deixa. Não adianta. 

Depois de ficar uns dias hospedada na casa de uma prima em Novo Hamburgo, achei trabalho e lugar para morar. 

Nos dois anos e meio seguintes, fui garçonete, repórter em jornal e estagiária na Petrobras e na Prefeitura de Porto Alegre. Consegui uma bolsa parcial de uma entidade privada e uma bolsa na Unisinos para digitar a tese de doutorado de um professor que havia usado máquina de escrever. Mas o dinheiro não dava.

Toda semana, a mãe enviava um farnel pelo ônibus: pão feito em casa, feijão, polenta, legumes, frutas, dinheiro e uma cartinha com novidades. Eu morava perto da avenida que levava até a Unisinos e corria até lá para buscar o farnel precioso. Os motoristas e os colegas já sabiam o ponto onde parar e fazer a entrega.

O pai, naquele tempo, trabalhava em escritório e a mãe costurava. As camisas dela era impecáveis. E sei que volta e meia ela pedia empréstimo ao querido tio José, que era gerente da Eberle, para poder me ajudar. 

Aposentada, ela tem nas máquinas um acréscimo na renda, e hoje faz reformas e costura por prazer enxovais de bebês que minha prima Tânia entrega para os projetos sociais dos Capuchinhos. E ainda borda, faz crochê, escreve e pinta. Quando vou para Caxias, ela avisa:

– Traz tuas reforminhas!

Ela diz que gosta de estar como a Terra, em movimento.

É, dona Eluci, eu pedalo, mas não te alcanço!

Engordamento de praia: a miséria da política no jornalismo catarinense

Dois colunistas catarinenses tiraram o dia 8 de fevereiro para atacar o professor do Departamento de Botânica da UFSC Paulo Horta. Motivo: u...