quarta-feira, 25 de outubro de 2023

Sobre os livros impossíveis



Na odisseia pessoal que é escrever uma tese, sempre há um momento que fica como ápice do esforço sintetizado ao longo de quatro anos. O meu foi a busca por esse livro de capa amarela, “A construção do espaço social”, de Carlos Sánchez-Casas, com 92 páginas.

A primeira vez que li sobre ele foi na Introdução escrita por Emilio Martínez Gutiérrez para a edição em espanhol do livro seminal de Henri Lefebvre, “A produção do espaço”, presente que recebi em 2016 de minha orientadora, Gislene da Silva, na volta de sua viagem de estudos pós-doutorais na Espanha. Até hoje esse livro não foi traduzido para o português e as edições em francês eram caras e difíceis de conseguir. Li 18 livros e artigos escritos por Lefebvre e outros 7 por comentaristas de seu legado teórico, todos geniais, mas é certo que o caminho para a tese eu encontrei em “A produção do espaço”.
O fato é que, na citada Introdução, Gutiérrez discorre sobre a obra de Lefebvre e, em certo trecho, cita e resume a alienação urbana e afirma que segue o esquema proposto por Carlos Sánchez-Casas, indicando o livro na Bibliografia. Aquilo era fascinante! Com o título, iniciei a busca pelo livro. Nada! Nem um único exemplar em algum lugar acessível. E nenhuma citação do livro em outras teses e dissertações.
O autor, arquiteto e pesquisador, é espanhol. Descobri e-mails, enviei mensagens para ele, mas nada. Verifiquei que a Biblioteca da Universidade Complutense de Madri possuía um exemplar, e então pedi auxílio na Biblioteca Central da UFSC, que enviou mensagens para a UCM buscando viabilizar a leitura. Em função dos direitos autorais, informaram não ser possível fazer PDF do livro todo, mas de um capítulo sim, e anexaram uma imagem do Sumário para que eu indicasse em qual capítulo estava a parte de meu interesse. Eram 17 e eu não fazia a menor ideia. Frustração tremenda!
Mas não me dei por vencida. Enquanto pesquisava, lia e escrevia, me dividindo entre trabalho e estudo, toda sexta eu fazia uma busca para ver se o livro aparecia em algum sebo. Passados meses, um dia ele apareceu. Estava à venda em www.todocoleccion.net (onde agora tem mais um!), um sebo espanhol. Meus colegas de trabalho acompanhavam a saga pelo livro e o querido Maykon Lopes fez o pedido com seu cartão internacional, porque eu não quis esperar um minuto para liberar o meu para compra.
O livro demorou a chegar, passaram-se semanas, e então descobri que precisava pagar uma taxa de importação para liberar a entrega pelo Correio, onde ele estava depositado.
Quando recebi, foi uma festa, até bolo comemos no serviço. Acho que ninguém aguentava mais me ouvir falar do livro!
Pois bem. O livro todo é fantástico, mas a parte que me interessava, sobre a alienação urbana, está no capítulo sete e tem cinco magníficas páginas.
Valeu a pena? Sim! Graças ao arquiteto Carlos Sánchez-Casas eu consegui fazer uma ponte para, a partir da gigantesca teoria do espaço de Lefebvre, analisar a cobertura jornalística sobre ocupações urbanas, objetivo da tese. E essas cinco páginas estão me ajudando a pensar no tema de um dos meus próximos livros, sobre a teoria da reportagem.
Tudo vale a pena quando a alma não é pequena!

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