Audiência Pública de 17 de dezembro de 2021 |
SEMANÁRIO: O PLANO DIRETOR NA MÍDIA – 1
SOB O SOL DE JANEIRO
Os colunistas do jornal ND, do grupo de mesmo
nome, vem se prestando ao papel de porta-vozes da administração Gean Loureiro
em relação ao novo golpe que se anuncia para mudar o plano diretor de
Florianópolis. Na edição conjunta de 31, 1º e 2 de janeiro, sob o título “A
força-tarefa do Plano Diretor”, a coluna Bom Dia, de Fabio Gadotti, abre espaço
para o superintendente do Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis
(IPUF), Carlos Alvarenga, anunciar que as 13 Audiências Públicas Distritais – que
a legislação exige – serão realizada em um mesmo dia, 15 de janeiro, a partir
das 16 horas, todas ao mesmo tempo, em pleno horário comercial e no auge do
verão. Escreve o colunista: “Alvarenga disse que o Ipuf vai fazer ampla
divulgação nos bairros para incentivar a participação da população”.
Sério?! Só se as audiências forem sob guarda-sol
na praia.
CIDADE JUDICIALIZADA POR QUEM?
A mesma coluna, na edição de 28 de dezembro,
sob o título “Cidade judicializada”, critica as decisões judiciais para
suspender a Audiência Pública que seria realizada em 27 de dezembro – sim, 27
de dezembro! – como continuidade daquela feita pela Prefeitura em 17/12, e para
suspender as obras que irão afetar o entorno da Praça XV sem parecer de órgãos
ligados ao patrimônio histórico e artístico. Afirma o colunista: “São exemplos
de uma cidade refém da judicialização – proposta por segmentos que discordam de
políticas públicas e projetos de quem foi eleito para governar – e que acaba encontrando
guarida no Ministério Público e no Judiciário”.
O resultado da eleição implica silenciamento
das discordâncias?
Na mesma edição, o colunista Moacir Pereira,
sob a nota intitulada “A Ilha e as forças do atraso”, compara Florianópolis e
Balneário Camboriú para afirmar que na capital existe “ativismo ideológico” e
que “as esquerdas” tem apoio do Ministério Público e “vetam tudo”. É a atualização
de um discurso nascido no início dos anos 1990 e direcionado aos “contra”, como
se dizia na época e ainda hoje, buscando tachar a esquerda de ideológica,
reservando aos grupos dominantes a legitimidade para planejar a cidade.
O profundo autoritarismo que já marca as
discussões sobre o plano diretor de Florianópolis ficou evidente na Audiência
Pública convocada pela Prefeitura na noite de 17 de dezembro na Assembleia
Legislativa de Santa Catarina. Na ocasião, o que se viu foi uma completa
desorganização da mais estreita possibilidade de manifestação concedida, a “inscrição
prévia” de fala de 2 minutos. Muita gente que se inscreveu – pela internet ou
de forma presencial – não conseguiu falar porque às 22 horas era preciso
encerrar e desocupar o Auditório. Isso levou à convocação para a tal prorrogação
da Audiência em pleno 27 de dezembro, suspensa por uma medida liminar da justiça.
Vereadores foram até a mesa pedir que cedesse
e ele mais uma vez respondeu:
– Eu só estou pedindo que seja respeitada a
ordem pública, ordem pública tem inscrição prévia. É ordem pública. Se não for
respeitada a ordem pública, nós temos medidas a serem feitas.
A noção de ordem pública vem do sistema de
justiça criminal e de repressão estatal. Na audiência, essa “ordem pública” se
restringia à mera inscrição prévia cuja lista não foi publicizada, tendo inclusive
a mesa que coordenava o evento, pelos critérios adotados, dado direito de fala
duas vezes para uma mesma pessoa, como denunciaram participantes que não
puderam se manifestar.
O propósito de controlar em nome da “ordem
pública” é tão autoritário que o superintendente do IPUF ameaçou pedir
providências à segurança se não se respeitasse a ordem de fala.
O discurso, alertava o intelectual francês Henri Lefebvre,
exerce um terrorismo, torna a fala proscrita. O discurso da “ordem pública” naquela
audiência foi desmascarado pela completa desordem do que buscava legitimar, a
inscrição prévia.
Idealizador
da ideia do direito à cidade, Lefebvre, em artigo no livro “Du Contrat de
Citoyenneté”, publicado em 1990, lista o que nomeia como “Os novos direitos do
cidadão”. Entre eles estão o direito à informação e o direito à expressão. Diz
Lefebvre que um cidadão não deve nem pode ficar calado sobre o que o preocupa e
que lhe diz respeito, mesmo que apenas indiretamente: “Isso é muito: todos os
assuntos da sociedade preocupam todos os membros. Daí o direito de refletir, de
falar, de escrever” (p. 34).
Cabe
acompanhar, neste ano de 2022 que chega, em que grau a “ordem pública” deixará se
expressarem esses direitos em relação aos rumos da cidade de Florianópolis.
Nenhum comentário:
Postar um comentário